Médicos, dentistas e terapeutas passaram a procurar os cursos de especialização promovidos pela Sociedade de Medicina Antroposófica. Queriam ampliar seu conceito de medicina, para tratar o corpo físico levando em conta a força vital, os sentimentos, as emoções e a espiritualidade de cada um - os alicerces da antroposofia, que, em muito, se assemelha a outras sabedorias orientais e mesmo à de sociedades primitivas.
Steiner, formado em Ciências Exatas e editor das idéias científicas de Goethe - sim, o poeta e escritor alemão do século XIX, que era também um arguto observador da natureza -, jamais abandonou o rigor nas suas pesquisas. Ele não queria destruir a ciência, só ampliá-la. Steiner sabia que não existe apenas o mundo físico e que a cura envolve também os campos bio-energéticos mais sutis do ser humano.
A antroposofia estimula o lado direito do cérebro, responsável pela sensibilidade e pelo pendor artístico. É uma contrapartida à sociedade atual, que leva em consideração apenas o lado esquerdo do cérebro, o da racionalidade, da objetividade.
Apesar de muitos princípios e crenças, a antroposofia não é dogmática, não exige comprometimento total com suas cartilhas. Também não é seita, nem clube de associados, o que a torna simpática aos novos seguidores. Ao que parece, o admirável conhecimento deixado por Rudolf Steiner está se consolidando naturalmente porque é um manancial de soluções de bom senso para todos que percebem as relações entre o Homem, o planeta e o divino. E tem mesmo muito a ver com nossas avós. A antroposofia recupera o lado feminino. É o lado do amor, da proteção, do cuidado.
Pedagogia Waldorf - Uma pedagogia que respeita a alma
Em 1919, Steiner começou a pôr em prática seus inúmeros conhecimentos teóricos em Stuttgart, na Alemanha. Trabalhando numa escolinha para os funcionários da fábrica de cigarros Waldorf-Astoria (daí a origem do "Waldorf" como sinônimo de antroposofia), ele pôde aplicar o que intuitivamente sabia e o que tinha aprendido. O resultado surpreende ainda hoje e talvez como nunca. O impulso à criatividade e à autonomia, o amor à natureza e às artes, a prática da meditação e o conhecimento espiritual estão se transformando no projeto de vida de mais e mais pessoas, aqui e em todo o mundo.
Aos nove anos, os alunos plantam trigo, colhem, moem a farinha, preparam o pão em forninhos de barro que eles próprios fizeram. Assim, aprendem uma das lições do tema "de onde as coisas vêm", que compõe o conteúdo nesse período. Quando aprendem a escrever, fazem o caminho do calígrafo - experimentam o lápis, a pena de ganso, a caneta tinteiro. As aulas de História falam também de lendas e mitos - como o de Atlântida, o continente que foi engolido pelas águas, citado por Platão. O violino, um dos instrumentos mais usados nas classes, estimula a área ao redor do peito - assim, as cordas fazem vibrar o coração, o que promove o despertar das emoções. "Tudo é pensado para acompanhar o desenvolvimento anímico, energético e espiritual", explica Celina Targa, professora da Escola Waldorf Micael, em São Paulo.
A escola antroposófica não é feita para pais ansiosos (a alfabetização, por exemplo, só acontece no ano em que a criança completa sete anos). Os pais são convidados a participar, e muito, de todas as atividades. "Pode até se dizer que eles se matriculam junto com o filho", diz Celina.
Há pouco tempo, por exemplo, um grupo de pais da Escola Micael plantou trigo, moeu, cortou a massa numa antiga máquina de madeira trazida de Santa Catarina e se deliciou com uma macarronada feita com as próprias mãos. Tudo para compartilhar do aprendizado de seus filhos. E isso não acontece de vez em quando: sempre tem.
Arquitetura orgânica
A saudável bagunça que pode existir na casa de uma família antroposófica causaria arrepios em um consultor de Feng Shui. Mas, nesse ambiente, graças a Deus, as pessoas vêm em primeiro lugar. Depois, sim, consideram-se os móveis, a decoração e a ordem. Os sofás serão mais macios e confortáveis do que propriamente bonitos. A madeira estará muito presente nos móveis sólidos e pesados - em geral, feitos em marcenarias de pessoas que seguem a linha de pensamento antroposófico - e as cores das paredes lembrarão as tonalidades da terra: bege, ocre, marrom, creme, caramelo.
Quem sabe, virá da cozinha o cheiro do pão feito na hora. E se houver crianças na família, provavelmente você encontrará bichinhos de madeira ou bonequinhas de pano pelo chão. Em suma, uma casa sem frescuras, onde qualquer um entra e fica à vontade.
Habituados a ângulos e linhas retas, nossos olhos reagem dançando num primeiro contato com a arquitetura antroposófica. Assim como no espanhol Gaudí ou no americano Frank Lloyd Wright, incorporam-se formas orgânicas e naturais, mas considerando ainda os aspectos energético e espiritual do uso de cada ambiente.
As janelas não são simétricas e as paredes podem, por exemplo, estar colocadas em forma de trapézio, já que essa forma, acreditam, tem ligação com a liberdade e a individualidade. Para cada ambiente há soluções que levam em conta as dimensões mais sutis do ser humano. "A arquitetura orgânica tem o brilho da vida. Ela é dinâmica, tem fluidez e movimento", diz Michael Moesch, arquiteto responsável pelo projeto de muitas casas, fábricas e escolas de inspiração antroposófica no Brasil.
Espiritualidade na plantação
Outro ramo importante da antroposofia é a agricultura biodinâmica, que, além de ser orgânica (não utiliza adubos, aditivos ou inseticidas químicos), também respeita o caráter energético e vital dos alimentos. A plantação recebe diferentes "preparados". Há fórmulas de inspiração homeopática com base em substâncias naturais como cristal ou esterco, às quais se atribui o poder de concentrar energias. Os insetos podem ser combatidos com o cultivo de vegetais que os afugentam ou, de novo, com preparados energéticos. Os ciclos e influências planetárias também são considerados. Para completar, é comum o agricultor antroposófico ser alguém que se exercita nas artes, que faz teatro e medita. Ele é o que se pode chamar de um homem integral, tal qual sua plantação. O resultado é previsivelmente saudável e delicioso.
*Esse artigo foi retirado da revista Vida Simples. Mais informações sobre antroposofia você poderá encontrar no site: http://www.antroposofica.com.br/